quarta-feira, 5 de junho de 2013

UM PROBLEMA DO TAMANHO DA CIDADE

Por: Andrea Matarazzo
Fonte: http://www.arquitetura.com.br/artigos/artigo.php?idArt=110
Cuidar de calçadas é dever só da prefeitura?
Sim
A prefeitura acaba de aprovar na Câmara de Vereadores uma lei que flexibiliza multas para quem tem seu passeio danificado. Isso pode até atenuar o peso no bolso do cidadão, mas não resolve o problema.
A calçada é a via pública do pedestre, assim como a ciclovia é a via dos ciclistas, as ruas são as vias dos automóveis e os corredores são as vias dos ônibus.
Protocolei projeto de lei na Câmara de Vereadores que transfere para a prefeitura a responsabilidade pela recuperação e manutenção dos passeios públicos. A legislação atual, que atribui o ônus aos proprietários dos imóveis, não funciona. A questão vai além da discussão de multas. Estamos falando de mobilidade urbana. São Paulo tem mais de 1,5 milhão de pessoas com deficiência. Por que não as encontramos nas ruas? Certamente pela impossibilidade de circular nas calçadas.
A falta de recursos tem sido, há anos, a justificativa que encerra a discussão sobre o tema. Há dinheiro para ruas, corredores, ciclovias. Então é natural que haja verba para fazer calçadas. Recursos não são fáceis, mas existem. O que falta é, definir prioridades e estabelecer uma meta para resolver o assunto.
Desde 2008, as rotas estratégicas definidas por lei municipal da então vereadora e atual deputada federal Mara Gabrilli (PSDB-SP) abrangem 3.000 quilômetros de calçadas, que concentram 80% da circulação de pedestres. Estas já são de responsabilidade do poder público.
Existem regiões que não têm a questão fundiária regularizada, como grandes áreas nas zonas sul, norte e leste. Não é possível exigir que os proprietários façam as calçadas se nem o título de propriedade dos imóveis eles têm.
Outras áreas, de interesse social, são isentas de IPTU. Da mesma forma, se não é cobrado o imposto do morador ou do comerciante sem condições financeiras, eles obviamente não têm como pagar pelas calçadas. Em ambos os casos, a responsabilidade já acaba sendo do poder público.
Pode-se, também, instituir uma forma de reembolso para grandes imóveis, shoppings, prédios públicos ou novos acima de determinada dimensão. As calçadas seriam executadas pela Prefeitura e o custo reembolsado pelo empreendedor.
Hoje cada morador faz seu passeio de maneira aleatória, tornando a cidade uma colcha de retalhos intransitável. Imagine se as ruas também fossem uma incumbência dos donos dos terrenos. Cada um faria o seu pedaço do jeito que achasse mais adequado ou bonito.
Somente a prefeitura pode estabelecer especificações técnicas rígidas e uniformes para as calçadas. Elas são tão importantes quanto as ruas, se não mais. São um elemento utilitário, não decorativo.
Sempre entendi as calçadas como encargo do Executivo, pois só ele tem condições de atuar como mediador entre os atores envolvidos na questão.
O dono de uma casa não destrói a área na sua porta. Quem quebra é um agente externo, como as concessionárias de serviços ou até a Secretaria do Verde ao plantar uma árvore ou ainda quando suas raízes crescem e levantam o piso. Não faz sentido, portanto, cobrar o conserto do proprietário daquele imóvel.
É preciso mudar o conceito da manutenção de calçadas, tornando-as seguras, limpas, iluminadas e sinalizadas. São Paulo tem mais de 60 mil ruas e 35 mil quilômetros de passeios públicos. Por isso, a questão deve ser regida pelo Código de Trânsito: afinal, a circulação de pessoas por essas vias é similar ao fluxo de veículos pelas ruas, ambos de responsabilidade do poder público.
O problema é grave. Tem o tamanho de São Paulo e precisa ser enfrentado com coragem e prioridade.

ANDREA MATARAZZO, 56, vereador (PSDB) em São Paulo, foi secretário de Estado da Cultura (2010-12) e secretário municipal das Subprefeituras (2006-09).

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